quinta-feira, 29 de janeiro de 2015






POEMA EM LINHA RETA


Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Poema extraído do livro "O EU PROFUNDO E OS OUTROS EUS ", Fernando Pessoa, antologia poética, editora Nova Fronteira)


COMIGOS DE MIM

Tenho mais companhia
Se estou só
Pois meus “comigos de mim”
Falam comigo.
Melhor que isso até:
- eles me escutam!
E dão-me espaço
Para refletir....
Pairo, serena,
Na quietude-abrigo
Calo, uma a uma,
As vozes que destoam...
Ouço os murmúrios
Que ainda em mim
Ecoam
E abro todos os portais
Ao meu sentir...
Serenidade é o som
Que, me envolvendo,
Vai permeando as ondas
Que me embalam
Pelos desvãos
De ruídos que
Se calam.
E é minha voz que ouço
A me falar...
Na calmaria do
Poder pensar
Envolta só na luz
Que veem do alto.
Nesse mistério vôo
Dou meu salto
Fecho os olhos
Pra enxergar
e então
medito
Para encontrar um mundo
Mais bonito
No doce enlevo de
Saber calar....

            Linda Brandão Dias

domingo, 4 de janeiro de 2015

RESUMOS

Quem me traduz o mundo são meus sonhos...
São eles que alicerçam meu futuro,
Que lançam luzes no caminho
Mais escuro
E em seu fluir esboço
A minha vida....
Tais como estátuas de perfis risonhos
São eles que me acendem as estrelas
E que me fazem suspirar
Por vê-las
Numa versão mais leve
E colorida...
Quem me ensina a beleza
São as flores
Que se compõem em nuances
Variadas
Na cartela seca e cinza
Das estradas
Dando de graça a graça
Recebida....
E é na paleta intensa
Dessas cores
Que pinto as metas
E desenho os rumos
De cor e amor compondo
Meus resumos....


                                   Linda Brandão Dias